A data do descobrimento de ouro e seu real
descobridor geram versões contraditórias e criam divergências entre
historiadores.
A primeira notícia oficial da descoberta
do ouro deve-se ao paulista Antônio Rodrigues Arzão, que partindo de
Taubaté, colheu o metal precioso nos sertões do Rio Casca em 1693.
Oficializando tal fato em 1965.
A notícia da descoberta do ouro
espalhou-se rapidamente. A febre do ouro contaminou milhares de pessoas.
O sertão foi tomado de assalto por bandeiras que se multiplicavam e as
descobertas aumentavam ininterruptamente.
O grito da descoberta também foi ouvido
ainda mais longe, na outra margem do atlântico. Ávidos de fortuna fácil
vieram para o Brasil não apenas portugueses, mas gente de todo tipo,
todos irmanados pela mesma fome de ouro.
A notícia despertava novas ambições e
provocava novas investidas. De todo lado, homens guiados pelo desejo de
fazer fortuna atiravam-se a uma região totalmente desconhecida e
despreparada para recebê-los.
Havia ouro, muito ouro, as descobertas se
sucediam. Em alguns riachos bastava mergulhar a batéia e ficar rico. Era
o delírio.
As minas chamadas "Gerais" localizavam-se
na serra do espinhaço, de formação geológica mais antiga do Brasil.
As minas de ouro eram de duas naturezas;
ou eram depósitos aluvionais ou rochas matrizes. O toque do ouro
encontrado oscilava entre 21,5 e 22,5 quilates. A cor também era
bastante variável: ia desde o amarelo brilhante, que era mais comum, até
a cor de latão (esbranquiçado - ouro branco). Havia ainda o ouro escuro
(ouro preto), o da cor de bronze (avermelhado) e o ouro sem brilho, que
dava a impressão de sujo e era denominado "ouro podre".
As áreas de garimpo eram organizadas por
um sistema de "datas", que era conhecida conforme o número de escravos.
De caráter restritivo e eminentemente
escravista, a mineração impossibilitou que o homem livre e pobre (mesmo
que tivesse algum escravo) de possuir sua lavra, pois para o serviço de
exploração nas minas era necessário muitos escravos.
Para estes pobres sobrava apenas o serviço
de faiscagem que mal dava para o sustento. Mesmo assim entregavam-se a
sorte. A tentação do ouro corrompia a razão.
Ecoando em todos os cantos e províncias do
Brasil, a notícia da descoberta de ouro ocasionou profundas convulsões
no sistema demográfico, em virtude da corrida para as minas.
A única preocupação dos milhares de
pessoas que se dirigiam para as áreas das minas era a exploração do
ouro. Ninguém pensou em desenvolver nenhum tipo de cultura para atender
às necessidades imediatas. Essa falta de estrutura de subsistência levou
a região a dois períodos de fome intensa.
Muitos morriam de fome com os bolsos
cheios de ouro. A cobiça era maior que os perigos. Mesmo assim
multiplicavam-se os aventureiros.
Faltava porém um governo de peso na
região, onde a lei era determinada pelos paulistas, que após duzentos
anos nos sertões e descobridores das minas, achavam-se os donos da
riqueza; o que tornou inevitável os conflitos com os recém chegados.
A partir de 1707, as disputas entre
paulistas e recém chegados (os emboabas), pelo controle da região
passaram a ser resolvidas à bala; resultando em uma guerra civil, a
Guerra dos Emboabas.
Esta guerra despertou a Coroa para a
necessidade de aplicar com maior rigor uma política administrativa na
região das minas.
Para isto, foi nomeado pela Coroa Antônio
de Albuquerque Coelho de Carvalho, que se tornou um dos grandes
administradores da época.
Empreendendo um peregrinação pelas zonas
conturbadas, Albuquerque conseguiu impor a autoridade real, cedendo e
contemporizando com os revoltosos na medida do possível. Por fim para
colocar um termo às insatisfações que ainda persistiam São Paulo foi
elevada à categoria de Cidade, e a capitania do Rio de Janeiro foi
desmembrada, criando-se em 1710 a capitania de São Paulo e Minas do
Ouro.
Abria-se um novo período, norteado pela
ação mais racional do Estado, empreiteiro, a partir de então, do
movimento urbanizatório e do estabelecimento do aparelho administrativo.
O período mais intenso deste processo foi compreendido entre 1.711 e
1.715, e que Albuquerque inaugurou com a fundação de Ribeirão do Carmo,
Vila Rica e Sabará.
Seu sucessor Dom Baltazar da Silveira
continuou a obra fundando em 1.713, São João del Rei; em 1.714, Caeté e
Serro; em 1.715, Pitangui, Vila Rica, que mais tarde passaria a se
chamar Ouro Preto, tornou-se o maior centro minerador da colônia.
A década de 20, nos anos de 1.700, foi
literalmente de ouro para a Coroa Portuguesa.
Enquanto as Minas Gerais andavam em plena
produção, os paulistas continuavam buscando riquezas pelos sertões. Em
1.718 encontraram o metal em Mato Grosso e na Bahia. Anos mais tarde
Bartolomeu Bueno da Silva descobre ouro em Goiás. Novamente a cena de
delírio repetiu-se. Em dez anos os bandeirantes encontraram mais ouro do
que em 200 anos de buscas, provocando mudanças sociais e econômicas em
todo território brasileiro.
Ao mesmo tempo, o abastecimento das minas
começa a evoluir, mesmo com os caminhos precários que levavam às minas.
Começava a surgir a figura do tropeiro que abastecia a região,
juntamente com aventureiros baianos que comercializavam seus produtos.
Os tempos de fome acabaram.
A administração no entanto, não veio
apenas para instaurar mecanismos para melhorar a vida nas minas, sua
principal atividade era a cobrança de impostos sobre a mineração, e que
assumiu várias formas ao longo do século XVIII.
De uma forma genérica, houve dois sistemas
básicos de cobrança dos impostos, o do quinto e o da capitação. O
primeiro consistia na determinação de que a quinta parte de todos os
metais extraídos deveria pertencer ao rei. O quinto do ouro era deduzido
do ouro em pó - único dinheiro que corria nas minas, ou em pepitas,
levado às casas de fundição. A capitação era mais abrangente e mais
lucrativa para a Coroa. Ela consistia, quanto aos mineradores, em um
imposto cobrado por cabeça de escravo, produtivo ou não de ambos os
sexos acima de doze anos. Os mineradores sem escravos também pagavam o
imposto por cabeça, no caso sobre si mesmos.
Em 1.719 um decreto régio determinou a
criação das Casas de Fundição em Minas Gerais. Todo o ouro destinado a
exportação tinha de ser levado a essas casas, que, após a dedução do
imposto, deveriam fundi-lo, moldá-lo em barras e marcá-lo com o selo
real.
A nova lei também proibia a circulação do
ouro para fora dos limites da capitania. Os transgressores seria
severamente punidos.
A imposição deste sistema fiscal agrediu
interesses e provocou revoltas. As medidas provocaram um reação em
cadeia por todo o território de Minas.
A agitação era grande, e dentre os mais
exaltados estava Filipe dos Santos, tropeiro natural do reino, que
estava à frente dos dois mil homens que, em 1.720, marcharam de Vila
Rica para Ribeirão do Carmo (atual Mariana), na época sede do Governo de
Minas. O rebeldes ameaçavam com desobediência geral e chegaram a pedir o
afastamento do governador, que recuou fazendo promessas.
Os liderados por Filipe dos Santos certos
do triunfo deixaram Ribeirão do Carmo retornando para Vila Rica. O
governador, o Conde de Assumar, assim que se sentiu seguro partiu para o
revide. A repressão foi rápida, brutal e eficiente. Com um exército de
um mil e quinhentos homens ocupou Vila Rica na madrugada de 1.720.
Os verdadeiros cabeças da rebelião,
Pascoal da Silva Guimarães e Manoel Mosqueira da Rosa - ricos
mineradores, foram presos e suas casas incendiadas. Obrigados a desfilar
pelas ruas da cidade, foram mandados acorrentados para Lisboa. Para
Filipe dos Santos sobrou o pior. Foi preso e escolhido para servir de
exemplo. Executaram-no sumariamente e seu corpo, depois de ter sido
arrastado pelas ruas, foi esquartejado. Sua cabeça ficou exposta no
pelourinho de Vila Rica e as outras partes do corpo foram espalhadas
pelas estradas.
Em 1.725 as Casas de Fundição se pôs em
funcionamento. Após este fato que ficou conhecido como Revolta de Vila
Rica, os representantes da capitania de Minas Gerais comprometeram-se a
pagar 37 arrobas de ouro por ano. A medida no entanto, só fez aumentar o
contrabando, o que desviou boa quantidade de ouro.
Ouro... Ouro... sempre ouro por todos os
lados, sobretudo na mente e no coração daquela gente. Entretanto nem
tudo eram rosas. Na base da sociedade dourada, estavam os escravos:
negros lançados em África como bestas selvagens, para o duro trabalho
nas minas de ouro.
Sabe-se que os sudaneses iorubás, também
chamados de nagôs ou minas, provenientes da Costa do Marfim, sempre
foram preferidos para o serviço nas lavras, por serem altos, robustos,
inteligentes e duros no trabalho. Além disso tinham faro para descobrir
ouro. A exploração do ouro, sobretudo, era feita no fundo dos rios. Os
depósitos aluviais, peneirados na batéia - instrumento de origem
africana, esgotam-se rapidamente.
O trabalho pesado era feito pelos
escravos, que carregam nas costas a economia colonial. Passavam o tempo
todo dentro da água, lavando o cascalho em busca do ouro, num clima
frequentemente frio, ou dentro de galerias profundas, com desabamentos
habituais. Viver sete anos significava viver muito. Sórdida e triste
vida que lhes fora imposta.
No entanto, os escravos do ouro criaram
mecanismos para perpetuarem sua origem africana. Naquele tempo,
ensinavam as crianças escravas as músicas, os ritmos e a devoção aos
deuses, como uma das formas de resistência cultural e até mesmo
política. E assim os pais transmitiam todas as tradições negras às novas
gerações.
Mas os portugueses, atentos a todos os
sinais de rebelião, vigiavam de perto as danças, cantos e ritos. E por
isso negros incorporaram aos seus cultos, nomes de santos católicos:
Nossa Senhora das Mercês, São Benedito, Santa Efigênia e Nossa Senhora
do Rosário. Fingindo cultuar o deus e os santos dos brancos, os escravos
mantinham oculto, porém vivo a devoção aos seus orixás.
A mineração consumiu cerca de 470 mil
escravos. Vem bem ao caso lembrar a história de Chico Rei, capturado na
África juntamente com sua tribo, vendido como escravo a um rico senhor
de lavras de Vila Rica. Chico, com o fruto do trabalho extra comprou a
própria liberdade e a de seu filho, valendo-se de uma lei que permitia
ao escravo libertar-se, pagando ao dono o mesmo preço pelo qual havia
sido comprado.
Os dois trabalharam juntos nas minas de
ouro e, pouco a pouco "forraram" um por um todos os membros de sua
tribo. Livre da escravidão, graças a Chico, a coletividade chegou a
comprar uma mina de ouro - a Encardideira.
Assustado com o rumo que as coisas estavam
tomando, El Rei de Portugal criou nova lei, proibindo que, daí em
diante, os escravos comprassem a própria liberdade. Com seu grupo, Chico
Rei organizou uma espécie de corte particular em Vila Rica. E voltou a
ser soberano da tribo, como nos bons tempos da África.
A descoberta e a exploração do ouro
brasileiro ocorreram no reinado de D. João V, entre 1.706 e 1.750. O
período foi marcado pelo desvario típico dos que enriquecem depressa.
O monarca estava encantado pelo volume de
ouro que chegava à Lisboa. E gastavam muito, mas muito mesmo. Tinha
costume de presentear amigos com caixotes de ouro e pedras preciosas. Em
seu desvario esbanjava como nunca a riqueza.
Em 1.716, mandou construir o Palácio -
Convento de Mafra, feito apenas para pagar uma promessa pelo nascimento
de sua primeira filha. A obra foi o maior exemplo de desperdício da
história portuguesa. E para tanto foram envolvidos 60 mil pessoas na
execução total desta obra faraônica.
Enquanto isso os nobres portugueses que
trabalhavam no Brasil e retornavam ao reino, também ostentavam a riqueza
que o ouro proporcionava. A média de ouro que eles levavam, era cinco
vezes maior que o ouro arrecadado pela Coroa. Era um luxo só.
De uma outra forma, o ouro veio aliviar
momentaneamente as dificuldades financeiras de Portugal. A dependência
lusa com relação à Inglaterra era um fato. O tratado de "Comércio e
Amizade de Methuen", firmado entre os dois países em 1.703, indica esta
diferença.
Neste tratado Portugal obrigou-se a
permitir a livre entrada de tecidos ingleses de lã e algodão em seu
território, enquanto a Inglaterra comprometeu-se a tributar os vinhos
portugueses importados com redução de um terço do imposto pago por
vinhos de outra procedência.
Genericamente, os resultados deste tratado
não foram positivos para os lusos. O abastecimento de Portugal e do
Brasil com produtos ingleses acarretou um déficit comercial crescente de
Lisboa em relação à Londres. Esse desequilíbrio da balança comercial
entre os dois países, foi por muitos anos, compensado pelo ouro vindo do
Brasil que de forma direta ou indireta iam parar em mãos britânicas,
acelerando a acumulação de capitais na Inglaterra e impulsionando sua
revolução industrial.
O grande fausto português teve reflexos no
Brasil quando a riqueza dos mineradores passou a ser transformada em
luxo. Os ricos mineradores e comerciantes não quiseram ficar para trás.
A febre do fausto espalhou-se depressa por
todas as cidades onde havia mineração de ouro. Cada um queria casa mais
vistosa que a do vizinho, e freqüentar igreja mais rica. Tinham dinheiro
sobrando para pagar construtores e para contratar artistas para decorar
os ambientes.
Nascia assim o esplendor do barroca
mineiro, um estilo marcado pela riqueza dos elementos decorativos. O
barroca mineiro pode ser considerado como a primeira manifestação
artística de uma cultura local e não mais reprodução dos padrões
europeus. Entre os grandes artistas plásticos do período se destacam:
Antônio Francisco Lisboa - O Aleijadinho e Manuel da Costa Ataíde.
Com a fortuna consolidada, os ricos e seus
filhos letrados passaram a ter uma vida social mais sofisticada. Vila
Rica ganhou teatro e orquestra. Músicos eram pagos para compor em
ocasiões solenes, como grandes missas ou estréias teatrais. Os
compositores deixaram uma magnífica obra. Lobo de Mesquita compôs, entre
outras a Antífona de Nossa Senhora e Missa em Sibemol; o Padre José
Maurício se destaca com várias obras, sendo a mais importante a Missa de
Requiem.
A arte barroca mineira, de inestimável
valor histórico e cultural tiveram como fonte de inspiração, a nostalgia
rítmica dos negros, a religiosidade mística de aventureiros, os sertões
sem fim de Minas e lógico o fascínio do ouro e dos diamantes.
A felicidade da fortuna parecia não ter
fim. Ao lado do ouro estava os diamantes descobertos na Região de Serro.
A sociedade "rica" e eufórica parecia não ter limites a pompa. Minas
estava então no seu apogeu. Vila Rica era por obra da natureza cabeça de
toda a América, pela opulência das riquezas - a pérola preciosa do
Brasil.
Um fato que bem ilustra este estado de
graça proporcionado pelo ouro, são as festas barrocas, em particular o
Triunfo Eucarístico - festividade religiosa que retirou o Santíssimo
Sacramento da Igreja do Rosário e o conduziu triunfalmente para a Matriz
do Pilar, que retrata muito bem o estado de euforia da sociedade
mineradora.
O que estava sendo festejado é antes o
êxito da empresa aurífera, do que o Santíssimo Sacramento. É a
comunidade mineira celebrando a si própria, festejando o sobrenatural, o
extraordinário, e mitológico ouro.
Num outro momento, 1.748 outro grande
momento de efusão barroca: A Festa do Áureo Trono Episcopal, que
celebrava a criação do Bispado de Mariana. Da mesma forma que o Triunfo
Eucarístico, a festa foi extremamente luxuosa.
Fatos indicam ter sido esta festa, o
momento em que se encerrou o apogeu e começou, lentamente a decadência
do ciclo, evidenciado pelo baixo volume de extração de ouro.
O ciclo do ouro, de grande importância na
história do Brasil, e que usualmente se conta nas escolas, como um
período de riqueza e até mesmo de opulência da Minas Gerais, de longe
expressam a verdade. A realidade é bem diversa.
O tipo de sociedade que se formou nas
Minas Gerais tinha características próprias. Como as de outras regiões
da colônia, era escravista e senhorial; porém as cidades eram mais
urbanizadas e com um maior fluxo humano. Os controles sociais eram
mínimos, o que favoreceu o aumento de uma massa de homens livres e
miseráveis, à margem da sociedade.
Vítimas do sistema, essa grande maioria
era constituída de mestiços e negros forros em estado de extrema
pobreza, nascidos na miséria, criados na indulgência e sem a menos
subsistência.
Para estes miseráveis, a injustiça e a
desigualdade. O poder de mineração estava nas mãos dos ricos e
poderosos, uma minoria. Para a grande maioria, o povo, apenas a miséria,
o descaso e a exclusão; também comum à nossa atualidade.
Após este ciclo um novo ouro começa a
brotar da terra, o ouro verde. Ganha ícones de realeza e se transforma
em outro tesouro do Brasil - O Rei Café!
Ma esta já é uma outra história.
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