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::.. SINOPSE DO ENREDO ..::
G.R.C.E.S. RAIZ DA ZONA SUL - CARNAVAL 1995
Enredo: Chiquinha Gonzaga, Um Canto de Mil Gerações

O Grêmio Recreativo
Autor: Nelson Dalla Rosa

 

A MUSA EM FORMA DE CANÇÃO

Musa da inspiração... um canto novo ecoa pelo ar, e, ao longe, um vulto de mulher - meio deusa, meio mito - surge radiante, mãos ao piano, como que em meio à criação de uma obra-prima. O povo adere ao canto e entra no ritmo contagiante do samba, extasiado. Ao fundo, um estandarte azul e rosa tinge de alegria a majestade desta musa, trazendo à nossa lembrança antigos carnavais, como um rio que deságua no mar do presente, desvendando nossas verdadeiras raízes. Eis que é carnaval, e a nossa escola, comovida, vem à passarela repartindo contentamento e enaltecendo a mulher brasileira através da musa Chiquinha Gonzaga, mais do que nunca livre no seu caminhar!

UM CANTO DE MIL GERAÇÕES

Francisca Edwiges, mais conhecida como Chiquinha Gonzaga, nasceu no Rio de Janeiro a 17 de outubro de 1847, no aristocrático bairro do Velho Rio. Seus pais, o marechal de campo José Basileu Neves Gonzaga e dona Maria de Lima Gonzaga, impuseram-lhe educação refinada (como acontecia nas famílias tradicionais da época), primando pela erudição: Chiquinha levava várias aulas aprendendo a tocar piano ainda criança, revelando seu gênio musical.

Cedo também conheceu a vida repressora imposta às mulheres de seu tempo: aos treze anos foi lhe escolhido um noivo, filho de um rico comendador, que lhe proibia de tocar piano, justamente seu maior desejo. Após algum tempo de casada, resolveu livrar-se dos grilhões que prendiam-na àquela união, abrindo mão do conforto e da segurança de uma vida financeira até estão estável. Desta forma, contrariando os costumes da época, sabia ela que, doravante, as portas se fechariam para si. E assim aconteceu. Marcada pela sociedade, traçou um caminho de abnegação e sacrifício, tudo por um ideal de liberdade e amor à arte: abraçando a música, sua verdadeira vocação, deixou às futuras gerações um inestimável acervo cultural, na alegria de seus versos, ritmos e melodias.

A MPB NA ÉPOCA DO II IMPÉRIO

As manifestações musicais mais antigas conhecidas no Brasil são o lundu (gênero de dança de origem africana) e a modinha (canção amorosa e sentimental de origem portuguesa). O lundu passou a ser praticado também como gênero de salão, ao contrário da modinha, que, nascida nos salões da aristocracia, popularizou-se, servindo de base às futuras serestas e às demais formas líricas brasileiras.

Influenciada pelo lundu e pelas modinhas, Chiquinha Gonzaga (nascida durante o II Império) tomou parte também da difusão de gêneros de danças de salão européias (como polca, valsa, tango, mazurca e shottish), muito em voga naquela época, e que deram origem a novos ritmos e tendências, resultantes do modo de tocar do músico brasileiro. Vêm daí o estilo instrumental do choro e do maxixe, que terá forte presença já no início do século XX, até ser substituído, mais tarde, pelo samba e pela marchinha.

O CARNAVAL CARIOCA

No Rio de Janeiro, o carnaval crescia em importância, ano após ano, com o povo saindo às ruas e caindo na folia. Até a família imperial participava do entrudo, folia típica do século passado. Em 1899, pouco antes do carnaval, o Cordão Rosa de Ouro encomendou à Chiquinha Gonzaga uma música que anunciasse a todos a sua chegada à distância. Nasceu então "Ô Abre Alas", pioneira marchinha carnavalesca, que fez sucesso por mais de vinte anos. "Ô Abre Alas" talvez não tenha sido a primeira, mas foi a pioneira.

UM POUCO DE SUAS OBRAS

Chiquinha Gonzaga compôs cerca de duas mil peças musicais, entre modinhas, polcas, quadrilhas, tangos e maxixes, além de diversas encomendas para musicar poesias. Com Viriato Corrêa compôs "A Sertaneja" (1915), "Juriti" ( 1919) e uma opereta, em 1933. Suas músicas, bem ao gosto popular, eram assoviadas nas ruas, cantadas nos serões familiares e tocadas nos cafés e nos bailes do Rio de Janeiro, conhecendo o sucesso numa época em que os meios de divulgação como o rádio ainda não eram conhecidos.

No Teatro Carioca, musicou peças como "Viagem a Parnasso" (de Arthur de Azevedo) e "Festa de São João" (de 1883), que ficou inédita. Setenta e sete partituras para teatro foram escritas, entre operetas, burletas e revistas-de-ano. Em 1887, Chiquinha colaborou de forma original na peça "A Zizinha Maxixe", de Machado Careca, com suas músicas "O Gaúcho" e "O Corta Jaca", caricaturando sonoramente quadros nacionais (principalmente os que retratavam o cotidiano carioca). Criou também um ritmo requebrado, jocoso, que traduzia a gíria carioca: o forrobodó, uma burleta de costumes cariocas, estrada em 1912, com estrondoso sucesso. A peça teve cerca de 1.500 representações.

Realizou seu primeiro recital em 1885, denominado "A Filha de Guedes", no Teatro Recreio Dramático. O evento causou grande burburinho no meio artístico, já que, pela primeira vez, um mulher regia uma orquestra (neste caso, a Banda da Polícia Militar). Chiquinha, já famosa pianista e grande compositora, tornou-se, a partir daí, a primeira maestrina brasileira.

Boêmia republicana, Chiquinha Gonzaga foi grande amiga de Olavo Bilac, Nair de Teffé, Osório Duque Estrada, Joaquim Callado (grande flautista brasileiro) e José do Patrocínio (com quem abraçou a causa abolicionista).

À FRENTE DE SEU TEMPO

Logo após ter completado cinqüenta anos de carreira, em 1935, Chiquinha Gonzaga faleceu aos 88 anos de idade. O peso do tempo, a luta pela sobrevivência e os sofrimentos causados por uma sociedade hipócrita em nada alteraram a magia de seus versos e melodias; ao contrário, seu talento musical em prosa e verso floresceu, berço aonde tremulava o estandarte de seu gênio criador.

A compositores teve um dos gestos mais heróicos na sua juventude, quando a mulher era alvo de toda sorte de preconceitos e asfixiada em suas mais inocentes aspirações. A vida, porém, abençoou-lhe com um coração realmente iluminado: Chiquinha Gonzaga passou toda a sua existência gerando arte através do amor.

Exemplo de coragem, dignidade e perseverança, Chiquinha Gonzaga esteve sempre à frente de seu tempo, como tão poucos que ousaram a concretização de um ideal nesta vida.

"Ó abre-alas que eu quero passar

Ó abre-alas que eu quero passar

Eu sou da lira, não posso negar

Eu sou da lira, não posso negar!"

 


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