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::.. SINOPSE DO ENREDO ..::
G.R.C.E.B.E.S. IMPÉRIO DO CAMBUCI - CARNAVAL 1998
Enredo: Império Volta às Origens

O Grêmio Recreativo
Autora: Raquel Trindade

 

APRESENTAÇÃO

Durante dez meses de pesquisas e de trabalho que envolveram diretamente dezenas de pessoas, a Escola de Samba Império do Cambuci se preparou para apresentar em forma de arte popular reflexões sobre a reconstrução da identidade cultural dos negros brasileiros.

Trazidos da África como escravos no período compreendido entre a segunda metade do século XVI e o ano de 1850 (data da extinção do tráfico negreiro), os negros perderam a sua origem. Ficaram sem antepassados, nomes ou bens próprios, enquanto cativos no Brasil, lutaram pela sobrevivência e reinventaram sua própria existência, ao conseguir manter através da tradição oral, mesmo que parcialmente, as culturas, usos, costumes, tradições e conhecimentos ancestrais.

O tema-enredo "Império Voltas às Origens" (Império Padá ai Ilú re), de autoria da folclorista e pesquisadora Raquel Trindade, é uma "viagem" da Escola de Samba em busca dos fragmentos da memória dos negros africanos arrancados a força de sua terra natal pelo capitalismo comercial e pelo movimento de expansão colonial. Representa também, como ressalta a letra do samba-enredo do compositor Dorinho Marques, o respeito de nossa Escola a esses negroafricanos e seus descendentes pela contribuição que deram, e continuam dando, para a organização social, política, econômica e cultural do Brasil.

Diante da impossibilidade de distinguir - no âmbito de um enredo - todos os grupos africanos que deram origem aos afro-brasileiros (os estudiosos cadastraram cerca de 280 etnias), a Império optou por apresentar amostrar da vida e das características dos três grandes grupos culturais de negros transferidos para o Brasil: Bantos, Guineanos e Sudaneses. Cada um abrangia populações de diferentes raças, clãs, tribos, nações e culturas que, por sua vez, tendiam a produzir uma grande variação de ramos do tronco cultural original.

A quase totalidade do visual da Escola reflete o ambiente geral da África do passado, revelando o que era básico, o que era comum a todos os grupos, resultado da existência de sociedades bem estruturadas. As alas, os destaques, os adereços e as alegorias (devidamente assinaladas no "Roteiro - montagem do desfile") mostram detalhes de épocas e de civilizações distintas, figuras, objetos e peculiaridades que caracterizam os mais conhecidos grupos africanos vindos ao Brasil. No final do desfile, na parte referente ao nosso país, a Escola mantém a mesma ambientação, pois foi essa essência, transposta principalmente pela profunda espiritualidade negra, que permitiu aos afro-brasileiros a recriação de muitas das particularidades africanas, além de sua sobrevivência e da manutenção da personalidade afro.

ENREDO

Nossa Escola de Samba conta neste desfile de Carnaval um pouco da história da África e da influência dos negros africanos em nosso país e na formação de nosso povo, do qual os afro-brasileiros representam cerca de 70% da população.

O "Império Voltas às Origens" (Império Padá ai Ilú re) mostra ser falso o quadro pintado sobre o negros pelos antigos padrões de cultura européia, ao generalizar todos os povos africanos como "antropófagos", "fetichistas" e "bárbaros". Mais tarde, antropólogos e outros estudiosos deram ao mundo outra visão do negro, inclusive dividindo a população da África em raças e culturas diferentes.

Os negros africanos trazidos à força para o Brasil pelos escravocratas do século XVI não apresentavam unidade racial e lingüística. Pertenciam à várias raças e falavam línguas diversas. Hoje se sabe que o primeiro homem surgiu no continente africano e que o espanhol Pablo Picasso, no início deste século, se inspirou nos antigos desenhos africanos para criar suas famosas pinturas, como facilmente podemos constatar pelos trabalhos feitos pelo pesquisador francês Pierre Verger, por muitos anos radicado no Brasil.

Para se fazer um estudo a respeito da presença do negro na sociedade brasileira temos que buscar suas origens. Observaremos, então, que os seus antigos costumes estão refletidos no que vemos hoje no Brasil, constatando que apenas os locais e as formas como se manifestam são diferentes. Na essência, porém, os "princípios" e as "bases" são os mesmo de séculos atrás.

Através da arte, a Império do Cambuci quer mostrar ao povo em geral e aos afro-brasileiros, em particular, um pouco do que os negros criaram e, assim, propiciar o fortalecimento da auto-estima entre seus atuais descendentes.

O pesquisador Artur Ramos divide as origens da cultura negra no Brasil em três grandes segmentos:

a) Cultura Sudanesa - representada pelos povos de cultura yorubá: Ijexás e Ketus (Nigéria), Fantis-Achantis (Costa do Ouro) e por grupos menores oriundos de Gâmbia, Serra Leoa, Libéria e Costa do Marfim. Os Yorubás chegaram ao Brasil por volta do início do século XIX, junto com os negros provenientes da Costa do Ouro, ou seja, mais de 200 anos após a vinda de representantes de outras nações africanas. Existiram vários reinos na Nigéria, como: de Oyó (com o príncipe Alafin), de Ifé e de Abeokutá.

b) Cultura Guineana - representada por Peul (Fulah), Mandingas, Haussás, Tapas e Gurunsis. Dos povos africanos trazidos ao Brasil, vários eram islamizados e foram chamados de Malês (na Bahia) e de Alufás (no Rio de Janeiro), bem como de Mandingas.

c) Cultura Banto - representada pelas tribos oriundas de Angola, Congo e Moçambique. Seus integrantes não tem tipos físico e lingüísticos homogêneo e se dividem em muitos grupos. Os primeiros chegados ao Brasil eram de Benguela, Novo Redondo e de São Paulo de Luanda (chamados de Angolas). Vieram também do Congo, Loango, Cacongo e Zaire (chamados de Cabindas e Congos). Os que foram embarcados em Moçambique (Contra Costa) eram chamados de Macuas e Angicos.

O nosso samba, hoje um dos símbolos da nacionalidade brasileira em cenários internacionais, é de origem Banto. No Brasil são originárias dos Bantos e dos Yorubás a herança cultural da música, dos cultos religiosos, dos ritmos, de instrumentos musicais (urucungos, berimbaus, cuícas e atabaques), das danças, dos fogos, de lutas (como a capoeira) e das artes plásticas.

A Escola de Samba Império do Cambuci diz ao afro-brasileiro que ele pode e viver integrado com a cultura do branco, assimilando-a, mas sem esquecer as origens de sua própria cultura, que é rica e deve ser preservada e desenvolvida.

 


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