Os tambores
anunciavam a batalha. Guerreiros pintados para guerra dançavam, sem
saber o que era medo e munidos de lanças, marchavam de encontro ao
inimigo.
O cenário
era a África do século XIX e na linha de frente estava Namonim, grande
rei Iorubá, acompanhado de seu filho Ajahi, primogênito e herdeiro do
trono, depositário de todas as esperanças da tribo.
Em volta da
imensa floresta, que se estendia a perder de vista, estavam as tribos
inimigas e quando finalmente o sol se pôs, o chão estava juncado de
cadáveres. Namonim e sua tribo foram vencidos na batalha, mas antes de
ser aprisionado ele gravou em seu peito a própria lança, para morrer
soberano como um verdadeiro rei.
Seu filho
Ajahi, juntamente com os outros guerreiros ferido foi aprisionado e
entregue a um traficante de escravos. Porém antes lutou muito e só
amarrado conseguiram arrastá-lo do corpo de seu pai, naquele instante
jurou em nome dele, que preferia a morte à desonra. Tudo em vão o
príncipe Africano habitava agora o porão imundo do navio negreiro, onde
havia como ele, muitos outros, todos com a mesma dor, porém com destinos
diferentes.
Chegando ao
Brasil, Ajahi foi vendido a um nobre comerciante baiano tendo que
trabalhar como escravo de ganho - menos mal, pois se economizasse a
simbólica porcentagem a que tinha direito sobre as vendas poderia mais
tarde comprar a própria liberdade.
Demorou dez
anos para Ajahi alcançar a liberdade, no entanto quando a teve, seu
pensamento continuava em seu povo, que em algum lugar sofria, seja no
tronco ou na senzala, enfim, o martírio da escravidão continuava.
Na cidade
conheceu Gangara, negra bonita que trabalhava como mucama em casa nobre
e conheceu outros negros, juntos formaram um grupo que tinha como meta a
libertação de sua raça. Raça essa, que já era três vezes maior que a
branca, e se tudo desse certo poderia tomar o poder. Ajahi era muito
conhecido por isso se tornou líder - ressurgiu aqui um novo rei, um rei
Nagô em terras brasileiras.
O plano
estava armado: colocariam fogo na cidade chamando a atenção das tropas,
enquanto isso, fariam prisioneiras as pessoas mais ilustres da região,
para que em troca fossem libertados seus irmãos Nagôs.
Tudo estava
certo, mas seus planos falharam. Ajahi foi capturado e fuzilado em praça
pública. Sua mulher Gangara fugiu para o Quilombo dos Urubus, situado
nos arredores de Salvador e numa madrugada de neblina deu a luz à Uesu,
neto de um rei Iorubá, filho de um guerreiro que pagará com a própria
vida o seu sonho de liberdade.
O Quilombo
dos Urubus, era por certo o refúgio dos negros fujões naquela região,
aliás, chamava-se Quilombo dos Urubus pelo fato de existir uma grande
quantidade de aves dessa espécie, que eram como verdadeiros guardiões
dos macambos ali localizados. Pelo aspecto sombrio e hostil do local e a
presença dessas aves, era raro a presença de aventureiros, capitães do
mato e os mais corajosos eram surpreendidos por diversas armadilhas
camufladas pelas matas, acabavam se transformando em comida dos urubus.
Urubus
também eram chamados os habitantes do Quilombo eram comandados pelo
urubu rei (chefe da tribo). Entretanto a cada geração um novo rei era
aclamado e não bastava ser forte e corajoso, principalmente, teria que
amar o próximo sem distinção de cor ou raça, simplesmente respeitar para
ser respeitado.
Em relação
ao cenário daquele lugar, só podia-se dizer deslumbrante. A fauna e a
flora eram de extrema beleza, o que era sombrio e hostil para o invasor,
para os urubus era o surgimento de uma nova África.
O tempo
passou e no quilombo já se falava em um novo rei. Percorrendo a floresta
como de costume, Uesu ouviu um gemido não muito longe e ao se aproximar,
deparou-se com um homem branco que, com um enorme esforço pediu-lhe
ajuda. Com um enorme coração e largando mão de qualquer rancor social,
Uesu salvou a vida do infeliz levando-o para o Quilombo. A partir deste
feito o jovem negro foi aclamado rei do Quilombo dos Urubus.
Dessa
dinastia de negros soberanos e guerreiros, chegamos aos dias atuais onde
encontramos um outro rei, descendente dessa mesma linhagem, mas o seu
reino é o da folia, pois comanda o Carnaval. Seu coração é proporcional
ao seu peso, com seu gestual agitado e contagiante ele comanda a
felicidade geral nos cinco dias em que o Brasil apaga as suas dores e se
faz feliz.
Salve o
nosso Rei Momo, que no "Jubileu de Prata da Barroca", comandará nossas
esperanças de amor, folia e principalmente igualdade social.
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