|  
 O território onde hoje se situa o bairro de Vila Madalena fazia   parte de uma imensa floresta, cenário grandioso onde era encenado um   apoteótico bailado. Os sons da Mata Atlântica criavam  uma sinfonia   selvagem, de ritmo bárbaro e grandioso,  enquanto bandos de araras num   sincronizado vôo exibiam sua coreografia aérea. Na sinuosa dança das   águas dos igarapés, cardumes de peixes encenavam seu balé aquático. No   chão, animais dançavam para seduzir suas fêmeas, e serpentes em suave   dueto deslizavam entre arbustos. Embaladas pelo vento,  as árvores iam e   vinham num ritmado "balancê".  Os índios, como parte   integrante dessa imensa floresta, cantavam e dançavam por qualquer   motivo, inspirados por esse balé da natureza. Presos aos tornozelos dos   hábeis bailadores, chocalhos feitos de seixos, sementes e dentes,   marcavam o compasso da dança. Canindé, Canindé, cantavam e dançavam   pedindo vitória na guerra.  Os jesuítas, em seu processo de   catequese, para atrair os silvícolas introduziram as danças  nativas nos   rituais da nova religião. Criaram versos em tupi  para os cateretês que   os índios dançavam em frente às ocas. Adultos vestidos de penas e   listrados de urucu, acrescentavam o crucifixo a seus adornos, e   compunham as orquestras onde a guararapeva acompanhava o canto e a dança   dos novos rituais.   Nessa "zona rural" de São Paulo de   Piratininga, passavam tropeiros com seu imponente bailado equestre, e os   "cortadores de mato" dançavam a catira e o fandango.   Os negros, que se refugiaram   nessa "vila dos farrapos", ao fugir da escravidão, encontraram na música   e na dança o  consolo à crueldade dos castigos que tentavam esquecer. A   grande variedade de instrumentos de percussão facilitava a execução de   notável polirritmia, com um extenso quadro de danças dramáticas   fetichistas, os batucajés, ou as alegres danças profanas, os   desenfreados batuques. Aqueles vindos de Angola praticaram aqui os   rituais de coroação do Rei do Congo. Um belo cisne negro em seu vôo   migratório, fascinado pela dança dos homens de sua cor resolve ficar por   aqui.   Quando essa Vila Madalena não passava de um   amontoado de casas e pequenas chácaras, seus moradores iam de casa em   casa encenando a Folia de Reis, e dançavam a quadrilha em volta de   fogueiras.   Mas o espírito festivo que conhecemos   na Vila Madalena de hoje, chegou com os estudantes da USP, "dançarinos   saltimbancos" que  encheram  o bairro  de alegria e irreverência.  Chegaram os hippies e seus cabelões ,  e o som do roqueiro Piriri   "balançou" os bares e as ruas  da "Vila Woodstock". Entre girassois,   purpurina, harmonia e simpatia, a irreverência dançou no "Santa Casa". A   Feira da Vila abriu as portas para a entrada de "bailarinos giramundo",    brincantes que chegaram com a capoeira, o frevo, o  reisado, o   maracatu, o boi-bumbá e a gafieira.  Dançarinos foliões vindos do   mundo inteiro escolheram a vila como cenário para a encenação da   gigantesca "ôla" que deixou saudades depois da Copa do Mundo.  Pelas ruas que dançam num sobe-e-desce, os blocos carnavalescos arrastam multidões: SACUDAVILA, Os Madalena.........  Pois é mesmo o samba,  PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL DO BRASIL, que   traduz a alma dançante da Vila Madalena. Ao som da bateria da Pérola   Negra, até os mais silenciosos vizinhos, os moradores do Cemitério São   Paulo, vão "balançar o esqueleto". |