PROPOSTA
A expressão é antiga,
mas poucos conhecem o seu significado. Falar do
"Conto do Vigário" é falar da própria história do
Brasil. São truques, manhas e cambalachos que
trouxeram e ainda trazem vantagens para muita gente.
Vigaristas, 171's, salafrários, malandros e
falsários misturam-se ao carnaval para viajar na
imaginação do povo. É assim que chega a Unidos de
Guaianases, em verso, prosa... e muita lorota.
DESENVOLVIMENTO
O português Antônio
Teodoro desembarcou no Rio de Janeiro, em 1814,
elegantemente vestido, com uma fala macia e maneiras
educadas. Dizia-se herdeiro único de um tio padre
que acabar de falecer na "terrinha". Dono de
fabulosos tesouros, aos novos amigos cariocas contou
que teve de abandonar Portugal pois estava sendo
perseguido por parentes despeitados e gananciosos
excluídos do testamento. Um procurador cuidava dos
problemas legais e em breve, jurava ele, todo aquele
tesouro lhe chegaria às mãos.
Meses se passaram e as
riquezas não chegavam. Antônio dizia aos amigos que
a demora lhe causava dificuldades. Diversas famílias
se ofereceram para ajudá-lo, adiantando-lhe
dinheiro, também foi homenageado com lautos
banquetes em terra fluminense.
Depois de um ano, com
Antônio vivendo bem, a custa de amigos, eles
resolveram investigar e descobriram que Antônio
Teodoro era conhecido trapaceiro da Rua do Ouro, em
Lisboa. Ele foi preso, mas o golpe que aplicou
chegou até nossos dias com o nome que ganhou na
época: Conto do Vigário!
Esta história se
passou no século 19, mas outros contos do vigário
aconteceram muito antes do golpe aplicado pelo
português. No descobrimento das terras brasileiras,
por exemplo, Portugal tomou posse deste torrão
considerado "desabitado". Mas... e os índios? Não
eram os donos, já que era os primeiros habitantes?
Terras tomadas, terras
desbravadas.
Quando o Bandeirante
Bartolomeu Bueno da Silva encontrava-se entre os
índios de Goiás, tentou sem resultado, obter
informações acerca das minas de ouro existentes nas
cercanias em que os indígenas sabiam a localização,
mas não queriam contar. Foi então que o Bandeirante
teve uma idéia genial: chamou-os e, colocando
aguardente numa vasilha, ateou fogo. Os silvícolas
ficaram espantados por ver líquido, que julgavam ser
água, transformando-se em... fogo! Bartolomeu
ameaçou-os, então, dizendo que se não lhes contassem
o local das minas queimaria todos os rios das
redondezas. Apavorados, os índios indicaram o local
e ainda o apelidaram de "Anhanguera" ou seja"Diabo
Velho".
Cansados de enganar
nossos pobres indígenas, os portugueses foram bem
longe: África.
Embarcando em solo
africano, no século XVI, os lusitanos iludiram
aquele povo, presenteando-lhes com espadas, espelhos
e bijuterias, avisando que poderiam obter muito mais
no novíssimo continente americano, em confortável e
rápida viagem pelo oceano. Seria um cruzeiro
marítimo? Não, era apenas um conto do vigário, já
que vieram empilhados no navio negreiro "Valongo".
Mais tarde veio o
troco.
A febre do ouro
assolava as fantásticas terras de Minas Gerais.
Tamanha era a riqueza que fidalgos e aventureiros
não paravam de chegar. As bateias estavam nas mãos
dos negros escravos, cujo castigo era a morte, no
caso de esconderem qualquer grama do precioso metal.
Mesmo assim, espertos, depositavam o pó de ouro em
suas carapinhas e posteriormente o retiravam, em
local seguro, com água. Muitos negros conseguiram a
sua alforria através deste processo.
Os portugueses eram os
reis da malandragem. Em 1808 chegava a corte real ao
Brasil, com um séqüito de 15 mil pessoas, no Rio de
Janeiro. A cidade não estava preparada para receber
tanta gente; foi quando surgiu a idéia: desalojar
boa parte da população cedendo suas residências para
o povo luso. Nas fachadas das casas colocaram as
iniciais "PR", ou seja, "Príncipe Regente", mas o
povo revoltado batizou-as como "prédio roubado" ou
"ponha-se na rua"...
A independência do
Brasil, nos moldes históricos, foi uma outra
roubada. O fato aconteceu por circunstâncias
econômicas, já que não restava muita coisa para ser
aproveitada em nosso torrão. O grito da
independência já era esperado pela Família Real.
Ah!... mas tem o conto
das multinacionais!
Como se sabe, o solo
brasileiro constitui-se num dos mais tentadores
cofres de riquezas do mundo, e foi assim que na
Carta Constitucional de 1934 (Governo Getúlio
Vargas) decretava-se abertas as portas da nação para
a implantação de empresas multinacionais;
principalmente as norte-americanas, a quem devemos
nosso respeito e muito dinheiro também.
Foi assim que o Brasil
cresceu e acabou criando os seus próprios "contos do
vigário", tem aquele do plano de saúde recheado de
carências, poucos recursos e altas taxas de
mensalidade. No conto dos "exploradores da fé"
existe a promessa de um lugar no céu, por um preço
bem acessível. Quem já ouviu o da Reforma Agrária,
certamente observou que mais da metade do país não é
efetivamente ocupada, mas essas terras tem dono...
coitadinho do "sem terra". O conto da inflação é um
dos mais longos, coisas que o povo até já sabe.
Engraçados são os juízes de futebol - ganha o jogo
quem pagar melhor, este deve ser o "conto do apito",
e para terminar, nada como os alegres muambeiros e
suas falsas mercadorias, trazendo do Paraguai o
"conto do gato por lebre".