Laroyê Exú!
 
Peço licença para poder contar a história que um dia tentaram apagar.
 
Cheguei forçado a essa terra e senti na pele a tirania do opressor, porém, nunca perdi a fé nem nos momentos de dor.
 
Os intolerantes censuraram a minha gira, o terreiro virou alvo de ataque, quiseram até silenciar o toque sagrado do meu atabaque.
 
Acendi velas e pedi a Orunmilá que não me deixasse sozinho e foi do ifá, que o Deus Maior trilhou o meu caminho.
 
Fui orientado a aceitar santos católicos em meu congá e dentro das imagens de barro e madeira, esconder fundamentos do meu orixá.
 
Encantei o "sinhô", que ao me ver de bruços e testa tocando o chão, achou que eu estava subjugado, aceitando a sua religião.
 
Mas, o que ele não sabia, é que num ato de sabedoria e coragem, na verdade eu cultuava a força ancestral que estava dentro da imagem.
 
O rito de fé de duas crenças se entrelaçaram num ato harmonioso, o amém e o axé se misturaram no sincretismo religioso.
 
Agora meu congá sagrado tem Maria e Oxalá Jesus, Preto Velho, Pajés e Exús, Erês, caboclos, guia de luz e todos os santos divinizados ao redor da Santa Cruz.
 
A força que me move e me permitiu lutar, vem do meu pai Ogum, que ocupa um espaço nobre em meu altar, Ogunhê, meu orixá libertador, tens a mesma armadura que Jorge, o santo protetor.
 
O sincretismo mudou a visão preconceituosa sobre certo e errado, o que para eles era profano, para nós era sagrado.
 
Nosso povo associou os santos de acordo com sua história ou vocação, as crianças gêmeas Ibejis, viraram Cosme e Damião.
 
Atoto Obaluaê, seu poder salva vidas, junte-se a São Lázaro para curar minhas feridas, e para cultuar Oxossi, o orixá caçador que carrega o ofá na mão, acendo velas e faço rezas usando São Sebastião.
 
Kao Kabecilê Kao, bendita seja a justiça de Xangô.
 
Pois sois São Jerônimo sincretizado, aquele que domesticou um leão e na igreja foi consagrado.
 
Como nada é impossível, coube a Santo Expedito, por um capricho do destino, ter seu nome ligado ao pescador Logun Edé, o orixá menino.
 
Vejo um lindo arco-íris surgir no céu, é tempo de renovação, Arroboboi Oxumaré, salve São Bartolomeu a quem dedico prece e oração.
 
Aos poucos, o culto da igreja ficou parecido com o congá do meu terreiro, colocamos velas coloridas, flores e até mesmo água de cheiro.
 
Eu vi mãos femininas introduzirem nosso ritmo, cânticos e oferendas, guerreiras da nossa fé, que de tão valiosa contribuição, viraram lendas. Saravá!
 
Toda mulher preta tem um pouco de Yabá.
 
Ó Iemanjá, rainha dos oceanos, para que minha adoração continuasse com antes, por ti, joguei um barquinho ao mar e rezei para Nossa Senhora dos Navegantes.
 
Meu respeito a Santa Ana, Saluba Nanã Buruqué, ancestralidade e sabedoria, eu me curvo para você.
 
Ewá, tu que enxergas além das estrelas, dai-me a visão do meu destino, pelos olhos de Santa Luzia, protege tudo o que é puro e cristalino.
 
Ora yê yê o Oxum, mãe da fertilidade e da beleza, seu dourado é a cor da fé, a nossa maior riqueza.
 
A ti trago oferendas, canto pontos, faço oração, sincretizada na forma de Nossa senhora da Conceição.
 
Bato cabeça aos pés do meu congá, pois humildemente vou falar da maior guerreira Yabá.
 
Dentro da imagem de santa Bárbara, tem um fundamento que é pura energia, ele representa quem comanda os raios, tempestade e ventania, Eparrey Oyá, o teu eruexim traz a esperança de um novo amanhã, firmo o ponto no terreiro, me visto de vermelho, sou o protegido de lansă.
 
Essa é a história de luta pela liberdade de credo de um povo ancestral e que a Imperatriz da Paulicéia contará como enredo do seu carnaval, porque todos fazemos parte de um país sincretizado e miscigenado, onde o orixá pode ser cultuado e o santo divinizado.
 
Epa Babá, hoje a minha coroa imperial reflete o branco de Oxalá, para levar uma mensagem de paz para quem é de amém ou de axé, pois há espaço para todos no congá, o altar sagrado da minha fé!