
Ainda ouvimos soar as batidas dos tambores vindos de uma África distante. Do tempo que por mares nunca navegados, nos navios negreiros do destino, chegavam ao nosso Brasil, sob o som do estalo do açoite, os mais legítimos representantes da arte, da raça e da fé: os negros africanos.
Já na condição de escravos, no ano de 1502 chegam a América os primeiros negros, inaugurando a era colonial da qual será indissociável o tráfico negreiro.
Os escravos introduzidos no Brasil pertenciam a dois grandes grupos de línguas e culturas bem distantes: os dos Sudaneses, encontrados nas regiões mais ao norte do litoral africano, e os Bantos, nas áreas ao sul da linha do Equador, ambos abrangendo subgrupos étnicos de significativa diversidade. E os Bantos, eram as cambiadas, benguelas, congos, angolas e moçambiques que eram considerados excelentes agricultores e guerreiros. Os Sudaneses abrigavam os hauças, mandingas, nagôs, fulas, iorubas, jejes, fantis e achantis, os quais provinham de reinos africanos florescentes e tinham profunda sensibilidade para as artes em geral.
Todos esses irmãos de fé africanos tinham um só destino: as minas do Tijuco. E, como nos conta a história, a moeda corrente nas minas era o ouro, convertido em pequenas barras nas casas de fundição. A importação africana para o trabalho nas minas tornou-se mais intensa, contudo, não só as minas de ouro eram carentes do trabalho escravo. Em 1729, foi descoberto diamante no Tijuco, e com ele nova fonte de renda para a fazenda real. Para a administração dos terrenos diamantinos, foi criada em 1734 no Tijuco, a intendência dos diamantes. As terras diamantinas eram extensas e acidentadas, quase intransitáveis, e foi nesses pontos escusos que surgiram os primeiros garimpeiros.
A partir de 1772, a extração de diamantes passou a ser feita pela Real Fazenda, com 3610 escravos. No distrito de São João da Chapada em uma faisqueira, numa vertente do córrego de São João, logo na primeira experiência, encontram-se lindos diamantes azuis.
Entre garimpagem e descobertas, em 13 de outubro de 1831, o Tijuco é elevado à Vila, com o nome de Diamantina. O município de Diamantina, mantem-se fiel aos descobertos que o originaram. A paixão lúdica da mineração empolga os todos os habitantes, teimosos mineradores.
As faisqueiras seguem a todo vapor. O serviço de mineração é a moda primitiva e o tempo é integral: deitam-se com as galinhas e com elas levantam.
Os Calumbés balançam de um lado para outro, num verdadeiro balé de emoções e esperanças. Pois foi, dos Calumbés gingados pelas mãos desses vigorosos irmãos africanos, cheios de garra e determinação que vimos brilhar para o mundo nossos diamantes e, posteriormente, nossas primeiras pedras preciosas.
Foi durante esse apogeu que reinou em Diamantina a famosa e polemica escrava Chica da Silva, que deixou os guetos negros para ser esposa do Contratador português. Chica, que lhe deu treze filhos, tornou-se presença carismática numa sociedade tacanha que, de repente, se viu obrigada a estender seus melhores tapetes a uma ex-escrava. E como relata a história, a escrava que virou sinhá.
Entretanto, um fato curioso chamava a atenção nesse obstinado mundo das pedras preciosas. Era o canto de trabalho em forma de lamento, vindo de um coral de vozes, quase perfeito, entoado pelos escravos, em quanto trabalhavam na mineração.
Era o canto dos "Vissungos", o som mais puro do sofrimento.
Os "Vissungos" eram as cantigas de trabalho, que lhes davam energia, ao mesmo tempo em que trazia em suas letras, pedidos de bênçãos para o início do trabalho, louvação á suas crendices, e outro conclamado para que a colheita fosse farta. Contudo, todas sempre munidas de saudades de suas terras e de sua gente.
Mas era através de crendices, das superstições e dos feitiços, que eles mantinham vivas suas tradições e suas raízes.
O totemismo do boi era largamente disseminado entre vários povos Bantos. Um verdadeiro culto ao boi ao que chamavam de "A festa do boi Geroa". O boi comemora, o estado de paz e de abundancia da terra, tendo como cores, o branco e o preto.
Todavia, não só as crendices faziam parte do dia a dia dos escravos na mineração. Em seus momentos de pausa, uniam-se em grupo, num largo de terra de chão batido e cantavam e dançavam a "Dança do Canjerê".
Mas o tempo passou...
As coisas mudaram...
De nosso Brasil colonial, restam fatos históricos, tela de Debret, a algumas contradições sociais, tais como desigualdade e preconceito racial.
Entretanto, nessa viagem ao passado ao presente, um fato histórico acontecido quando o império já dava sinais de exaustão, queremos recordar. Foi quando uma princesa de inegáveis méritos e poderes, fez valer sua autoridade regente e, garimpando nas águas da justiça, garimpou a pedra preciosa da liberdade: " A Abolição da Escravatura". Foi quando no Rio de Janeiro, especificamente no Quilombo do Leblon, os escravos receberam a notícia de que havia sido decretada pela Princesa Isabel, a Abolição da Escravatura. Motivo este que os levou a se unirem uma vez mais, e colher o que de melhor tinham em seu cultivo para presentear a Princesa em sua casa em Petrópolis.
E assim foi feito. Colheram as mais belas camélias da plantação e com vários ramalhetes a presentearam. E qual não foi o orgulho de que foi tomada a Princesa pelo singelo presente, que sem mais demora, solicitou dos escravos mudas de camélias para que fossem plantadas nos jardins de seu palácio. Ficando a partir de então, sendo muito mais do que belas flores. Elas foram um símbolo da luta dos escravos e da elite negra, marcando a adesão da Princesa Isabel à causa do abolicionismo incondicional, e se transformando sem sombra de dúvidas nas Camélias da Liberdade.
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