Há quem
afirme que as origens do carnaval são encontradas uns 10.000 anos antes
de Cristo. Velhos textos declaram que ele teve sua origem no culto
agrário praticado pelos povos da antiguidade; homens e mulheres
mascarados, com corpos e caras tisnado, cobertos de peles ou plumas,
saíam em bandos, constituindo estranhos cortejos que invadiam as casas
numa terrível algazarra, gritando: "afastai-vos demônios".
Outros
autores fazem o carnaval nascer nas festas alegres do paganismo com a de
Ísis e do Boi Ápis entre os egípcios; outros ainda encontram-no entre os
Hebreus e nas bacanais, lupercais e saturnais de Roma. Em Suetônia,
encontramos a descrição do que ocorria em Roma durante as saturnais,
toda gente perdia a cabeça, homens, mulheres, crianças e velhos,
libertos e até mesmo escravos pareciam enlouquecer. Em frente das casas
armavam-se grandes mesas e todos, sem distinção podiam comer à vontade.
O comércio fechava, os tribunais não funcionavam, as escolas cerravam
suas portas. Época de tanta alegria e desvario que nela até os escravos
podiam dizer verdades aos seus Senhores, ridicularizá-los, fazer o que
desejassem.
Não se
encontrava verdadeiramente estabelecido o carnaval em sua esfera
especial e dominante até a época em que começaram a celebrar-se as
festas romanas denominadas saturnais. Estas, pela sua desenfreada
libertinagem e pelos cínicos palhaçados, perpetuaram no caráter e nas
inclinações dos povos essa paixão inveterada, essa propensão até certo
ponto orgânica das desordens anuais que certas solenidades parecem
imperiosamente incitar, diz uma enciclopédia. O carnaval teve como berço
não as festas das antiguidade, mas as da Idade Média afirmam certos
autores, mas que importam essas origens se o carnaval foi sempre a festa
de todas as alegrias, risos, brincadeiras, danças? As variadas origens
atribuídas ao carnaval levam-nos apenas a certeza de que, festa pagã ou
religiosa sempre existiu na história da humanidade, um determinado
momento escolhido pelos homens para expandir maior alegria, para rir,
cantar e pular mais livremente.
Ele é
encantado de formas diversas nos mais diferentes países e épocas; entre
os gregos, nas festas consagradas a Dionísio; em Roma a divindade
egípcia Isis; entre os teutões, a Deusa Herta ou Nerta a "Terra Mãe"
sempre existiu com músicas barulhentas, danças, máscaras, licenciosidade
veio do paganismo à Igreja Católica, se não o adotou, tolerou-o e
regularizou-o alguns países pais da Igreja como Tertuliano, São
Cipriano, São Clemente de Alexandria ou o Papa Inocêncio II, foram
inimigos do carnaval, mas o Papa Paulo II no século XV, preocupou-se
tanto porque a Via Lata, que desembocava em frente ao seu Palácio
permanecia silenciosa e deserta durante o ano todo, que conseguiu fazer
com que as festas do carnaval romano tivessem como sede principal aquela
rua, corrida de cavalos, carros alegóricos, confetes, uma extraordinária
luminária de tocos de vela molcoltti e mais a corrida de corcundas, o
lançamento de ovos e etc... o carnaval que divertiu os romanos durante
quatro séculos tinha como cenário a Via Lata.
O carnaval
do paganismo foi adotado pelo mundo católico com pequenas modificações,
se bem que guardando seus traços característicos sempre e em todas as
épocas, as danças e os disfarces. Na Grécia e na Roma Antiga saiam
preditos com pessoas mascaradas e um formidável carro, parecido com um
barco, puxado por cavalos enfeitados levava em seu bojo mulheres nuas e
homens que cantavam canções umpudicas; Era o carro novallis.
Na Espanha
da Idade Média, durante o carnaval, realizavam-se batalhas de flores; na
Alemanha, na Rússia e na França da Era Napoleônica, o carnaval teve
importante papel nas intrigas da Corte, na política e nos negócios.
Dizem mesmo que Napoleão mais de uma vez mascarou-se demonstrando gostar
não apenas dos divertimentos carnavalescos, mas das surpresas
ocasionadas pelas mascaradas.
O carnaval
em Veneza durante séculos forneceu matérias para muitas formas
literárias do drama ao sainete, passando como diz a Morales de Los Rios
pela nobilíssima ópera, foi menos dissoluto do que o da antiguidade o
carnaval da Idade Média, época em que se salientavam as festas dos
inocentes e dos doidos, que não eram mais do que formas diversas dos
mesmos festejos. Na Idade Média, começaram os bailes de máscaras, que
fizeram furor na França, realizando-se três vezes por semana a partir de
1º de novembro, e foram afinal proibidos porque, num deles, Carlos VI,
fantasiado de urso, sofreu um atentado.
No século XV
e XVI, a Itália criou a moda das mascaradas públicas enquanto faziam
sucesso os bailes da Ópera em Paris.
A Morales de
Los Rios, em longos artigos sobre carnavais a que assistiu em vários
países do mundo, diz que o carnaval substituiu mesmo através e depois da
Revolução Francesa, tendo até um verdadeiro renascimento sob o período
literário do romantismo entre 1830 e 1850 comenta ele. Byran dava as
suas preferências ao carnaval de Veneza; Goethe cantou o carnaval de
Roma. O carnaval Fluminense parece ser hoje o que resume todos os
outros, e talvez Byron e Goethe, se o pudessem conhecer, ficassem de
acordo com as suas preferências.
Num desses
artigos, Morales de Los Rios lembra o grande baile de máscaras promovido
pelo instituto real de pintores e aquarelistas em 1884, em Londres,
festas em que todos os artistas ingleses se fantasiavam com máscaras de
seus mestres gloriosos do passado ou com a de príncipes e monarcas
amigos dos artistas.
No fim do
século XV e começo do século XX, quase desapareceu o carnaval na Europa.
Hoje se fala apenas no de Nice, com seus desfiles, corso, bailes e
música, a canção do carnaval é apenas uma mudança todos os anos, e não é
um delírio coletivo, uma alegria e multidões, é mais um divertimento
para um grupo, enquanto centenas de pessoas assistem, compartilhando
como aconteceu neste ano de 1957 apenas batalhas de confete.
Morre o
carnaval na Europa, ela que já possui os mais belos de Mundo: Veneza,
Munique, Roma, Colônia e posteriormente, Nápoles e Florença.
E a palavra
carnaval de onde vem ela do covium novalis com o qual os romanos abriam
seus festejos, dizem uns. Vem de caro-vale ou adeus à carne pois que ele
marca o início da quaresma cristã, afirmam outros. Luiz da Câmara
Cascudo acha que a lição mais idônea é contida do verbete que Adoufo
Coelho escreveu no dicionário de Frei Domingos Vieira: Carnaval; s.m. do
italiano carno a vale o dialeto milânes tem caenelevante do baixo latim
carnelevamen de caro, carne e levamem ação de tirar assim pois tempo em
que se tira o urso da carne, pois carnaval é propriamente a noite antes
da quarta-feira de cinzas.
Esta
etimologia que é dada por lithe, põe de lado a mais antiga.
Segundo a
qual a palavra vale e o milânes carne-vale tira as dúvidas quanto ao
som, tempo de divertimento que varia de extensão segundo os países, mas
que começa sempre depois do primeiro dia do ano e acaba na véspera da
quarta-feira de cinzas.
Deixemos aos
outros a discussão sobre a origem da palavra carnaval e continuemos
apenas viajando em torno de fatos. Remexendo carnavais de outras eras e
passando rapidamente pelos carnavais de outros países, até chegarmos ao
nosso o único que realmente interessa a este livro, se bem que ele tenha
recebido daquelas muitas influências.
Inicialmente
as festas carnavalescas começaram em 25 de dezembro envolviam as
comemorações de Natal, Ano Novo e Epifania. Depois seu período foi
marcado pela Páscoa dos Católicos. Sabemos que o domingo de páscoa deve
cair sempre entre 22 de março e 25 de abril. Fica assim explicado o
motivo pelo qual a folia carnavalesca ora cai em fevereiro, ora em
março.
E o carnaval
português? O que trouxeram os colonizadores como festejos de Momo para a
nossa terra? Ninguém melhor que um português para falar de seu carnaval,
pelo que reproduza trecho de um artigo de Júlio Dantas, publicado na
Gazeta de Notícias em 21 de fevereiro de 1909.
Nós,
portugueses, nunca compreendemos que o entrudo pudesse ser uma festa
dárte como na Itália da Renascença, ou uma festa de espírito como na
França de Luiz XIV, o nosso entrudo, o santo entrudo lisboeta, foi
sempre fundamental e caracterizadamente parco.
O século
XVII, então, exedeu todos os outros. Foi no século típico do entrudo
nacional. Depois de uma melancólica descrição dos três dias solene em
que a velha Lisboa de 1.700 dizia o tradicional "Adeus a Carne" toda a
máfia baixa das vielas e das alfujas passando pelas fregonas, os
devassos, os circumpectos e até os próprios fidalguinhos peraltas, todos
com a casaca de seda a escorrer ovos, a cara empastada de sangue e lama,
cobertos das maiores imundices e dos mais sórdidos desejos, corriam as
ruas debaixo da saraivada dos pós das panelas, das laranjas de cheiro,
da farinha, dos esguichos, dos ovos de gema, de toda a água que jorrava
das rótulas estreitas e dos poatigios mouriscos, diz Júlio Dantas que no
meio de todo esse carnaval de miséria e sordidez não se via uma única
máscara. As máscaras haviam sido proibidas pelo governo por um alvará de
agosto de 1689.
Ainda a
mais, justamente no séclo XVII, que fez do entrudo uma ópera; digo uma
Obra de Arte, quando Arlequim perdurara o seu manto multicor pelos muros
de Veneza e Florença, quando o próprio nariz vermelho de polichinelo se
metia pelas tapeçarias do Vaticano, o velho sant'entrudo português
surgia apenas boçal, imundo, desordeiro e criminoso, ao tempo em que a
regência ordenava os bailes de máscaras, em que a ópera instituía os
Aprés Souper, em que Versailles se iluminava para receber Pierrô, D.
João V, piedosamente tocado pela devassidão do carnaval do povo de Roma,
para a Capela Real, o jubileu das quarenta horas, e enquanto a plebe
bêbada, coberta de lama e de farrapos dançava, ecouceava, grunhia
obscenidades pelas vielas, erguia-se em São Roque uma pirâmide dourada,
estrelada de lumes, a Consagração de Nossa Senhora da Doutrina, D. João
V, impotente para fazer do entrudo uma festa de arte, converteu-o em
ultimo recurso, numa festa de religião.
Nas grandes
casas (o carnaval) era um pretexto para se comer melhor, dos conventos
choviam bolos, o velho Marquês de Marinalva, degenerado e guloso,
esvaziava enormes canjirões de prata e fazia se seguir de bandos da
crianças mascaradas de anjos, os Marqueses de Gouveia faziam andar o
pobre Penharanda (o escravo negro) de gatinhas, a roda de um salão,
vestido de verde e com grandes bigodes postiços.
Conta-nos
Júlio Dantas que o primeiro baile de mascaras realizado em Lisboa foi
dado pelo Embaixador da Espanha em 1785, para comemorar o casamento de
Carlota Joaquina. Mas um dia veio Pina Manique, cão de guarda do antigo
regime, abraçado ao código de polícia de Luiz XIV e ao tratado de
polícia de Willebrand e proibiu o entrudo, as máscaras, assim como
prendeu o livreiro Dubia por vender Rousseau.
Para
robustecer essa descrição Júlio Dantas, há esta notícia na Enciclopédia
Portuguesa Brasileira: Pelas ruas (em Portugal) generalizava-se uma
verdadeira luta em que as armas eram ovos de gema, ou suas cascas
contendo farinha ou gesso, cartuchos de pós de goma, cabaças de ceras
com água de cheiro, tremoços, tudo de vidro ou de cartão para soprar com
violência milho e feijão que se despejavam nos alqueires sobre as
cabeças dos transeuntes, havia ainda as luvas com areia destinadas a
cair dechofre sobre os chapéus altosos de coco dos passantes poucos
previdentes, e até se jogava entrudo com laranjas, tangerina e mesmo com
pastéis de nata e outros bolos. Em tachos de barro e alguidares já em
desuso, como depois se fez também no último dia do ano, no intuito de
acabar com tudo velho que haja em casa. Também se usavam nos velhos
entrudos portugueses a vassourada, as bordoadas com colheres de pau,
etc... nos fins do século XIX, Lisboa e Porto quiseram civilizar o
entrudo e começaram a aparecer pelas ruas, além do avinhado ché-ché da
capital e do Zé Nabo do Norte e dos pseudoacrobatas das danças de lutas
das Cegadas e das paródias e das carroças de José Augusto, pregados de
sermões chocarreiros, algumas mascaradas vistosas e interessantes, como
em Lisboa as Clubes de Salsas, composta pelos sócios do Clube
Tauronaquático e do Clube Turfe. Destacaram-se então como inovação a
garbosa (batalhões) populares da ajuda, alfama e campo de ourique, as
batalhas de flores, de carros ornamentais e o carnaval do Porto,
organizado pelo Clube dos Fenianos, com um esplendido cortejo de carros
alegóricos e aparatosa cavalgada.
Na primeira
metade do século XX, o carnaval quase se limita a exibição de crianças
mascaradas e aos folguedos nos teatros e cinemas. Foi esse entrudo
português trazido pelos colonizadores e por eles aqui implantado que
durante três séculos imperou em nosso país, nesta cidade. Com ele
começamos os festejos de Momo, e não apenas nós, mas também todos os
povos da América Espanhola, pois que as calamidades do entrudo "porco
brutal" eram comuns à Península Ibérica.
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