O Grêmio Recreativo e Cultural Escola de
Samba 1ª da Aclimação, presta uma homenagem e traz como tema para o
Carnaval 2002, a história, da vida do sambista percursionista,
compositor e intérprete Armando da Mangueira.
1ª PARTE: DA ORIGEM AOS PRIMEIROS
PASSOS NO SAMBA. RIO DE JANEIRO
Descendente de árabes, seu pai carioca
(filho de libaneses) e sua mãe libanesa de religião muçulmana, Armando
José Daguer, seu nome de batismo, foi considerado um dos maiores
sambistas de todos os tempos.
Nascido no Rio de Janeiro, na Barra da
Tijuca, em 09 de outubro de 1937, ficou órfão de pai quando ainda
contava com 8 anos de idade, ocasião que por problemas financeiros,
acompanhado de sua mãe e seus dois irmãos, "Karminha" e "Dagura", também
menores, tiveram que abdicar do luxo e do conforto da tão badalada Barra
mudando-se para uma casa modesta na Região Central da antiga Capital do
Brasil.
Sua trajetória no mundo do samba começou
muito cedo. Na "Zona do Saara", como era conhecida a antiga região
central do Rio, Armando aos 10 anos de idade, já possuía grande
habilidade com o apito e a frigideira (instrumento que mais tarde viria
consagrá-lo como o "maior frigideirista do mundo"), e desde então, era
apitador do tradicional "Bloco Senhor dos Passos", bloco em que sua irmã
"Karminha", era porta estandarte, dai para o famoso "Bafo da Onça", foi
um pulo.
Com o sangue de sambista correndo em suas
veias, Armando era mangueirense convicto.
Assíduo freqüentador dos ensaios da
mangueira fez muitas amizades com vários integrantes da comunidade.
Certo dia, o tão imprevisível destino, trazia Armando para a cidade de
São Paulo, porém, não o afastaria do samba por muito tempo.
2ª PARTE: VINDA À SÃO PAULO - RAÍZES NA
TERRA DA GAROA
Em 1950, sua mãe a libanesa muçulmana
"Dona Fátimi", comerciante de muita fibra, recebe uma proposta para
montar uma padaria especializada em produtos árabes, na região central
de São Paulo, zona da 25 de março, e com muita coragem transfere sua
família do Rio para um local que não conheciam.
Armando, meio a contra gosto, veio para
São Paulo, agora com 13 anos e não se conformava em ficar longe do
samba. Sempre que podia dava suas escapadas para a "Guanabara" onde
participava dos ensaios e das rodas de sambas tão comuns no Rio Antigo.
(Apenas para exemplificar: os meios de transportes da época (1950) eram
ainda precários e nem se comparam com os transportes dos anos 2000,
portanto, uma viagem São Paulo - Rio de Janeiro, era demorada e
cansativa, mas, mesmo assim o nosso menino sambista não media esforços.)
Armando, começa a fixar suas raízes em São
Paulo quando, aos 14 anos, conhece o grande amor de suas vida, "Lúcia".
Lúcia, filha de imigrantes libaneses, na
época tinha 10 anos, era simplesmente encantadora e já inspirava o jovem
rapaz, que a partir daí, começou a cantar e divulgar os sambas da
mangueira e tocar sua frigideira nas esquinas paulistanas (daí a alcunha
Armando da Mangueira), dando início então a um novo hábito na região do
mercado central. A "roda de samba". Que perdurou durante anos.
Quatro anos mais tarde, aos 18 anos,
Armando casou-se com a Dona Lúcia de 14, união que durou 45 anos. Do
fruto deste romance nasceram três filhos: José (1957), Fátima (1959) e
Armando (1968.
3ª PARTE: SAMBISTA PROFISSIONAL
Dotado de um carisma inigualável, de uma
voz imcomparável, Armando da Mangueira começa a receber propostas de
vários clubes para fazer shows, com sua inimitável frigideira. Neste
momento, Armando vai para o Rio, monta um senhor time, criteriosamente
selecionado, de músicos e mulatas, traz para São Paulo e batiza o
saudoso e talentoso grupo: "Armando da Mangueira e os Acadêmicos da
Guanabara".
Portanto, em meados dos anos 50, Os
Acadêmicos da Guanabara, sob a égide da frigideira de Armando, passaram
a introduzir na São Paulo, tão italiana, o verdadeiro show de samba
brasileiro, levando a nossa música aos locais mais requintados da
cidade.
Foram mais de dois mil shows, em clubes de
grande importância da época, hotéis cinco estrelas, boates, casas de
espetáculos, cassinos, que nos dias de hoje compararíamos com as casas
de espetáculos como Olímpia, Credicard-House ou Palace Shows, Canecão.
Durante mais de 35 anos, animou carnavais
de salão, bailes de gala, reveillon, shows turísticos e etc.
Eis aqui, a relação de alguns dos locais
em que brilhou com sua frigideira:
Clubes: Esporte Clube Pinheiros SP (fez
todos os bailes carnavalescos durante 20 anos), Círculo Militar SP,
Clube Paineiras do Morumbi SP, Esporte Clube Sírio SP, Monte Líbano SP,
Clube da Orla (Guarujá), Tortuga Clube (Guarujá), Ginastico Paulista,
Paulistanos, Internacional de Santos, Associação Banco do Brasil,
Banespa, entre outros;
Teatro: Aquário, Banana Power;
Boates: Urso Branco, Shalako, Garitão,
Beco, Som de Cristal, Clube de Paris e etc;
Cinema: Filme A Infidelidade ao Alcance de
Todos;
Televisão: vários programas: Chacrinha,
Xuxa, Clube dos Esportistas (Silvio Luiz) TV Record, especiais da TV
Cultura, especiais da TV Bandeirantes etc, Almoço com as Estrelas (TV
Tupi).
Na boate do "Five Star" Hilton Hotel de
São Paulo, durante 10 anos, fez shows de altíssimo estilo e pelo elevado
gabarito internacional, anos depois, 1989/1990 faria uma temporada na
Europa encantando à todos com o tilintar de seu instrumento preferido.
Em 1974, graças ao seu talento, sempre
representando as cores da Estação Primeira de Mangueira no cenário
musical nacional e internacional, foi condecorado, em alto estilo, na
quadra da tradicional Verde e Rosa, como "Comendador e Embaixador da
Mangueira em São Paulo", ocasião, em que recebeu das mãos do presidente
da Mangueira, o Sr. Djalma dos Santos um precioso "Cartão de Prata" com
honrarias, que até então, na Mangueira, só o Rei Pelé e o Presidente da
República "Geisel" haviam recebido.
4ª PARTE: SAMBISTA COMO COMPOSITOR E
PUXADOR DE SAMBA ENREDO
Em paralelo ao seu trabalho artístico, nas
casas de espetáculos, boates, clubes, hotéis e etc, Armando, no final
dos anos 50, com sua lambreta, descobriu na Zona Leste da Capital da
Garoa um novo amor em sua vida. A Escola de Samba Nenê de Vila Matilde.
Armando passou a ser ritmista da agremiação, até que em 1975, foi
convidado, pelo "Seu Nenê", por quem tinha grande amizade e admiração,
para defender, como puxador, os sambas da escola na avenida, cargo que
perdurou até o ano de 1993.
"Eu para sempre hei de te amar, tirando em
1º, 2º ou em qualquer lugar. Estou falando é de você, minha querida
Nenê".
Além de intérprete, Armando também tinha o
dom de compor, e com lindíssimas melodias, foi compositor de 8 sambas
enredos e vários sambas exaltação da Nenê.
Segue a relação dos sambas enredos que
Armando compôs na Nenê de Vila Matilde:
1975: Exaltação às Raças de um Brasil
Gigante - Armando da Mangueira;
"e este imenso céu azul é teto que abriga
toda essa gente bamba"
1979: Treze Rei Patuá - Armando da
Mangueira e Jangada;
"minha figa é verdadeira, bato três vezes
na madeira"
1981: Um Sonho de Candeia - Armando da
Mangueira e Jangada
"O seu filho será rei, orgulho corre na
veia"
1982: Palmares - Raízes da Liberdade:
Armando da Mangueira e Jangada
"é claridade, brilha a raiz da liberdade"
1983: Meu Gosto Abraçado à Ilusão: Armando
da Mangueira, Oswaldo Arouche e Biquinho
"Eu sou Nenê, e me disfarço neste manto
azul e branco"
1984: Sagração dos Deuses: Armando da
Mangueira
"A luz que vem de Aruanda, ilumina os
passos da Nenê"
1986: Rabo de Foguete: Armando da
Mangueira
"O cometa vai passar, traga a luneta pra
ver, as estrelas lá no céu, querendo sambar com a Nenê"
1987: Pernambuco Leão do Norte: Armando da
Mangueira, Miguelzinho da Vila, Pilica, Milton, Filé e Ricardo
"Maracatu, vaquejada, bateria da Nenê toca
frevo pra moçada"
Em 1976, Armando chega ao estreante Bloco
do Grêmio Gaviões da Fiel Torcida, influenciado pelo seu filho mais
velho, componente daquela agremiação é convidado por "Oswaldinho da
Cuíca", outro grande expoente do mundo do samba, para gravar o primeiro
samba da Gaviões no seu primeiro desfile, portanto, com muito orgulho,
Armando grava o primeiro samba enredo da Gaviões da Fiel.
Com uma inspiração inesgotável, Armando se
torna mais uma vez, um grande vencedor de samba enredo. Na Gaviões
ganhou 06 concursos.
"Amor, tu pode crer, eu sou corintiano até
morrer"
Armando, no começo dos anos 80, passaria
para a história da Escola de Samba Primeira da Aclimação, escola que
aprendeu a amar. Convidado pelo seu grande amigo, até o fim de seus
dias, Américo Garcia, presidente da conceituada agremiação, Armando
venceria 11 concursos de Samba Enredo, e com grande estilo melódico,
conduziria a Azul e Branco à evidência entre as grandes escolas de samba
de São Paulo.
"Quantas saudades, dentro de mim,
Aclimação até o fim"
"Deixa eu te vestir de azul e branco meu
amor, te ver sambar na 1ª da Aclimação"
Cabe ressaltar, que o samba enredo de 2001
da escola 1ª da Aclimação que exaltava outro grande nome do samba
"Geraldo Filme" também teve a participação de Armando. Foi seu último
trabalho.
O dia 27 de dezembro de 2000, marca o fim
da missão de Armando na terra. Armando deixa saudades, não só para o
mundo do samba, mas também, para sua esposa, três filhos, sete netos,
irmãos, sobrinhos e amigos.
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