“Dessa felicidade
Eu demorei acreditar
Mas ela existe de verdade
Guardo em mim
A energia da luz do meu talismã
Com esse meu trevo
Espalha alegria, e solto poesia de manhã”
(Samba-enredo, Camisa Verde e Branco, 1993)
Emoção na apuração dos desfiles das escolas de samba paulistanas, Antônio Pereira da Silva Neto, o Zulu, por meio de sua voz inconfundível, faz pulsar o coração do sambista.
Quem nunca sorriu feliz ao ouvir aquela “nota 10” especial? Quem nunca derramou aquela lágrima triste, meio incompreendida, pedindo um abraço caloroso após um “9.9”? Pela sua voz, a comunicação direta com o coração daqueles que constroem e sonham o carnaval.
Fiel e temente a Deus, sua voz é dom divino, inspiração que o faz grande comunicador do samba. Muito além da locução das notas, ele é grande Mestre do mundo do samba, homenageado pela Locomotiva Piritubana no carnaval 2021.
Paulistano, Zulu fez da Barra Funda, de tantas indústrias, seu berço de criação. E a Estação Barra Funda é ponto de partida de nossa Locomotiva pelas memórias de nosso homenageado. Numa veloz viagem, brincaremos como ele pelas ruas, em molecagens e traquinagens de criança. Valorizaremos a construção do caráter pela sua base familiar, dona Teresa e seu Gabriel, que vieram lá do sul de Minas Gerais, da pequenina São Tomás de Aquino. Estudou com dedicação, formou-se em mecânica e técnico em radiologia. Por anos trabalhou em hospitais, clínicas e no São Paulo Futebol Clube. Homem justo, fez amizades, provou dos amores da vida, construiu família com filhos, netos e bisnetos… Honrou os princípios ensinados por sua sábia mãe, mulher forte e raiz familiar: respeito, humildade, dignidade e caráter. Sob as bênçãos da Mãe querida de Aparecida construiu vida em alicerce ético e com valores.
Na juventude, a manifestação de seu dom. A voz de Zulu nas rádios anunciava bailes e festas da cidade. Nem imaginava o que o futuro lhe reservaria… Representando seu bairro, Zulu, que é corinthiano, jogava futebol amador pela cidade São Paulo. E foi assim que esse jovem, num certo carnaval, pelas ruas da Barra Funda, de tantas culturas, se encontrou com o Cordão carnavalesco do Mocidade Camisa Verde e Branco. Coração cativado pelo ritmo, o Cordão o levou para os braços do samba. Escondido da família, iniciou um longo namoro que virou casamento duradouro com sua escola de samba do coração: para sempre, haja o que houver, Camisa Verde e Branco…
No Camisa, conheceu seu grande amigo, Inocêncio Tobias. Ali, viveu a escola de samba com toda sua alma, de merendeiro a diretor de carnaval. Recebeu do grande Tobias a missão de cuidar da sua escola de samba. Mestre Zulu, o diretor de Harmonia, alma da tradição do samba. Quantos alegres momentos! Firme até mesmo nos tempos mais amargos: foram dez anos de jejum de títulos… Com passos fortes, lá na Tiradentes de outrora, sabendo que “quem gasta tudo num dia, no outro assovia”, valorizou a escola do seu amigo Tobias. “Em verde e branco, a esperança vai voltar”, tempo lindo de um carnaval mais amante do samba. Tempos áureos do Trevo no Anhembi. Camisa Verde e Branco e Mestre Zulu, amor para a vida toda, cujo combustível é a emoção que vem da Barra Funda, lembrando aquele enredo batizado por ele. Falar de um é lembrar do outro, salve as lembranças do samba paulistano!
Do samba, vieram tantas amizades, uma verdadeira “Reunião de Bacanas”, programa que apresentou na Rádio D’Oeste de Osasco… Mestre Sabu, Inocêncio Tobias, Carlos Alberto Tobias, senhora Sinhá, Jamelão, Delegado, Cartola, Dona Neuma, Dona Zica, Nelson Sargento, Carlos Cachaça… Abre a roda que tem um pouco de rosa no coração verde e branco do Mestre… O Morro da Mangueira é sua casa no Rio de Janeiro, mais uma parada para nossa Locomotiva. Para o carnaval trabalhou, doou sua vida e é história viva para tantas gerações. Quantas homenagens encheram de emoção a história desse homem: de Mestre da Harmonia à Embaixador do Samba, de sambista imortal à símbolo na Consciência Negra.
Em 1993, a primeira locução das notas do carnaval de São Paulo. Até hoje, em todas apurações, sua voz, dom divino inconfundível, é aguardada ansiosamente. Será que vem mais um 10 para escola do coração do sambista?! Pelos saberes divinos, 1993 foi o último título do grupo especial do amado Camisa. Naquele ano, o enredo foi “Talismã”. Desejando bons presságios, a Locomotiva faz do Mestre Zulu seu exemplo de humildade, baluarte inspirador, seu trevo-talismã para um futuro de glórias no carnaval. Pela voz do sambista, a emoção do carnaval e raiz do samba, as verdadeiras “notas 10”.
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