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::.. SINOPSE DO ENREDO ..::
A.C.E.S. UNIDOS DE TAIPAS - CARNAVAL 1996
Enredo: Não Entender é Melhor Que Tentar Explicar

O Grêmio Recreativo
Autor: Cláudio Ramos

 

Nas ruas de terra ou no fundo dos parques: você pode ver as crianças brincando. Chega mais perto que você vai acabar lembrando que brincou daquelas brincadeiras também! era pedrinha, cabra-cega, amarelinha, jogo da velha, mão na mula e aquelas antigas cantigas de roda. Se prestar bem atenção, também vai perceber que elas não sabem quem inventou aquelas brincadeiras e músicas, como você também não sabia; e que na verdade, nem querem saber. Agarrados às suas bonecas e carrinhos de madeira rústica, estão mais interessados em correr livres e sorrir bastante.

E todos sabem que sorriso de criança é uma benção.

Mas elas também choram, porque tem medo do "homem do saco", do "bicho papão", da "cuca" e de outros tantos monstros que a gente inventa para meter-lhes medo.

E se você souber uma história e quiser contar, elas irão sentar-se em sua volta satisfeitas e acreditarão em tudo que disser: porque nossas crianças são tudo aquilo que dissemos à elas e que acreditam que são. Por isso quando crescem, seguem aquilo que viram ou ouviram enquanto cresciam; e, da mesma forma, ensinarão aos seus filhos. Isso chama-se tradição.

Foram tantas as culturas se misturando ao longo dos tempos que não conseguimos mais saber de que continente vieram e de qual cultura. Não sabemos se vieram da África, com os negros; da Europa com os imigrantes e colonizadores ou se daqui mesmo, dos índios. Um tanto de uma cultura; outro detalhe de outra.

Pois a cultura também miscigenou. Primeiro é a medicina popular, que entra em nossa vida a todo instante e aparece muito cedo nas nossas febres de criança, no "mal olhado" e no "bucho virado" que a mãe-de-santo nos terreiros de umbanda, pedindo ajuda aos orixás, cura e benze com arruda de guiné. Se é verme, tem raiz pro bicho se assustar e fugir. Se é fraqueza, tem a garrafada de ovo de pata, mentruz e vinho. E quando o mal é na pele, basta um banho de raiz que a dor passa e afasta a coisa ruim.

Mas se você aprendeu que não presta cruzar com gato preto ou sair na sexta-feira dia 13, melhor não arriscar.

O mundo mudou como tem que mudar, mas a gente ainda acredita no que quer acreditar.

Se me pesa o medo da mandinga eu carrego um patuá. Pra proteger e trazer sorte. Para começar o meu dia, levanto com o pé direito e dou três pulinhos; depois coloco um galho de arruda na orelha direita, e sossego. Não me arrisco passar embaixo de escada; nem esqueço de cuidar da "comigo ninguém pode". Depois troco a água das espadas de São Jorge, que é guerreiro e protetor, e estão sempre combatendo seu dragão cuspidor de fogo.

Mas antes de sair de casa, penduro na porta uma ferradura, para guardar o lar. E não esqueço de juntar no meu chaveiro, um pé-de-coelho e um trevo de quatro folhas. Que assim, eu sei, vou estar protegido e com muita sorte.

Se estou com fome já vou chegando e me servindo; é arroz doce, é angu, sarapatel, buchada, cural, rabanada, acarajé, mandioca e mugunzá. Que é comida boa e diferente; as vezes forte e apimentada, as vezes doce e outras vezes salgadas. Sempre passo no centro de umbanda pra cumprimentar meu pai. Vou com a minha guia no peito, dou passagem pro santo, fecho o corpo e peço a benção. Sempre acendo uma vela, e quando bebo, toco um tanto pro santo, que é pra respeitar.

E se na batida do atabaque eu não sentir mais emoção, é porque não bato mais capoeira e estou perdendo a tradição; acaba que Oxalá se irrita e não vai mais querer me ajudar.

Por isso respeito o Tupã dos índios; acredito nas bruxas das crianças e na bandeira do divino. E quando meu filho nascer, vou pra ele dizer e ensinar, tudo aqui que vi e ouvi.

Sem me importar em entender.

Porque os tempos modernos tentam explicar as coisas com suas fórmulas e leis; tudo bem, aceito, mas nem tudo pode ser explicado pela ciência. Se me sinto bem com as simpatias e peço respeito às minhas tradições é porque eu sei que elas têm seu poder. Como respeito os tempos modernos, quero que respeite a minha tradição. Sou homem simples, tenho pouco estudo, mas tenho raiz.

Mas os tempos modernos e a televisão dizem que estou errado. Porque eles é que sabem de tudo, e querem explicar a verdade das coisas. Mas não entendem.

Se não entendem como querem explicar?

Por isso, se a gente tentar explicar algo que não entende, vai acabar complicando mais e estragando tudo. O que importa mesmo é a fé de que vai dar certo; o resto a gente deixa como está, que no fim Nosso Senhor acaba ajudando.

Mas os homens modernos são teimosos e não entendem que as vezes não entender, é melhor que tentar explicar.

Por isso estamos aqui com nosso carnaval, pra dar o maior exemplo de tradição.

 


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