No final de século XIX, Manaus vivia, graças às fortunas feitas através do comércio do látex das seringueiras, sua “Belle Époque”. Era uma das cidades mais prósperas do mundo, e, em nome da modernidade e do cosmopolitismo, passou por um embelezamento estratégico, adquirindo as feições e o requinte da capital francesa, sendo por isso chamada de “Paris dos Trópicos”. Nos salões dos palacetes falava-se francês, as mulheres elegantes usavam “toilettes” parisienses, e os cavalheiros acendiam charutos em cédulas de Libras Esterlinas.
Para Manaus, ser bela como Paris era muito pouco. Para os barões da Borracha, habituados a uma vida cultural requintada, com gosto pela literatura dramática e música lírica, a cidade deveria ser um marco da civilização brasileira, e para isso faltava uma Casa de Ópera, com os recursos técnicos adequados para receber as importantes companhias líricas européias, e os espetáculos que faziam sucesso nos palcos do velho mundo.
A construção do Teatro Amazonas foi proposta em 1881, mas as obras só foram iniciadas três anos depois, pelo Gabinete Português de Engenharia e Arquitetura de Lisboa, autor do projeto. Como os materiais utilizados em sua construção vieram da Europa, elas transcorreram de forma muito lenta. O ferro foi trazido da Inglaterra; o bronze, da Bélgica; as pedras de Liós para o calçamento externo, de Lisboa; As cerâmicas vitrificadas para a cúpula, vieram da Alsácia, e de Paris, as grades de ferro para camarotes, frisas e balcões, a armação da cúpula e os móveis estilo Luís XV; da Itália, mármores, escadas, pórticos, estátuas, colunas, lustres e espelhos de cristal, vasos de porcelana e candelabros; de Damasco vieram os tapetes e o veludo carmezim.O único material brasileiro utilizado foi a madeira de lei, que era enviada para a Europa e voltava já trabalhada para o Brasil na forma de móveis e piso.
O pernambucano Crispim do Amaral, cenógrafo da Comédie Française, foi encarregado da decoração do teatro, e teve como colaboradores os italianos Domenico de Angelis e Enrico Mazzolani.
Depois de doze anos do início das obras, o Teatro Amazonas foi inaugurado no dia 31 de dezembro de 1896. A população contemplou, deslumbrada, a grandiosidade da construção, com suas fachadas neoclássicas valorizadas pela cúpula de cerâmica com as cores da bandeira brasileira.
No seu interior, valorizado por iluminação feérica, circulavam damas com seus vestidos de cauda e cavalheiros de casaca e cartola, condizentes com a beleza e o luxo da decoração. No Salão Nobre, entre candelabros, lustres venezianos, colunas e portais de mármore, estátuas de ferro francesas, dourados barrocos e estuques rococós, admiravam o conjunto de pinturas neoclássicas de Domenico de Angelis, retratos da natureza amazônica pujante e diversa, com elementos da fauna e fora locais. No teto destaca-se a pintura "A Glorificação das Bellas Artes na Amazônia".
No salão da Platéia principal, em forma de lira, destacam-se os ornamentos sobre as colunas do pavimento térreo, com máscaras em homenagem a dramaturgos e compositores clássicos famosos, como Ésquilo, Aristóphane, Moliére, Rossini, Mozart, Chopin e Verdi, entre outros. Telas pintadas em Paris pela Casa Carpezot - a mais tradicional da época -, retratando alegorias à música, dança, a tragédia e uma homenagem ao compositor Carlos Gomes, compõem o teto abobadado, de onde pende um imenso lustre de cristal.
O pano de boca foi pintado por Crispim do Amaral, mas como essa noite foi apenas um ato protocolar, ele não se abriu.
No dia 7 de janeiro de 1897, quando a pintura que retrata o encontro das águas entre os rios Negro e Solimões, subiu ao teto, sem se dobrar, o público finalmente assistiu a estréia da famosa Companhia Lí rica Italiana, que encenou em avant première, a ópera "La Gioconda", de Ponchielli.
Após a estréia apoteótica da Lírica Italiana, a cidade vivia em torno do repertório encenado no palco do palácio neoclássico, que vivia seu apogeu. Suas escadarias serviam de passarela para "os homens que iam de casaca; as poucas senhoras, de decote e cobertas de jóias; as muitas cocottes, ainda mais decotadas e mais cheias de jóias",
Enquanto a cotação da borracha assegurou o progresso da região, a elegante sociedade manauara assistiu ao que existe de melhor no repertório operístico: “Aída”, “O Barbeiro de Sevilha”,O Baile de Máscaras, La Traviata, Carmem, O Guarany, etc
Mas no horizonte despontava a crise, com a entrada no mercado mundial da borracha produzida na Malásia, com mudas levadas da Amazônia pelo inglês Henry Wickhan.
Em março de 1908, a imprensa noticiava as primeiras quedas na cotação da borracha, devido à superprodução, e a crise fecharia alguns anos depois as portas do Teatro às grandes encenações.
Desde 1910, a cautela de empresários e grupos artísticos tornou-se rotineira. Concomitantemente ao declínio do monopólio da borracha, escasseavam os desembarques de trupes do exterior.
A ruína econômica silenciou o eco das árias entoadas nas noites de gala do Teatro Amazonas, que passaria por momentos de dificuldades, sofrendo um primeiro abandono. A população, saudosa de espetáculos, vai abrir o pano de boca do teatro para uma imaginária apresentação do Grande Caruso cantando “Rigoletto”, de Verdi, na inauguração do Teatro; para a lendária apresentação de Sarah Bernhardt recitando “Fedra”, de Racine; para o “cisne imortal” Ana Pavlova, dançando o “Lago dos Cisnes”.
Durante décadas, seria palco de espetáculos esporádicos: concerto do jovem Heitor Villa-Lobos em 1912, e da “piccola brasiliana” Bidú Sayão, em 1936.
Entre 1959 e 1969 recebeu o “Auto da Compadecida” de Ariano Suassuna; “Boca de Ouro”, de Nelson Rodrigues; “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de Melo Neto; “É Xique Xique no Pixoxó”, de Walter Pinto.
Na escassez de atividades musicais, foi também palco de banquetes, exibições de faquires e mágicos, bailes de carnaval, projeção de filmes sonoros, e depósito de borracha e gasolina.
Todo o acervo arquitetônico e artístico também foi danificado e saqueado ao longo de décadas, o que levaria ao seu tombamento como Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, em 1966.
Em setembro de 1975, Margot Fonteyn apresentou-se no Teatro Amazonas, como primeira bailarina do Royan Ballet da Inglaterra. Após sua apresentação, doou suas sapatilhas ao Museu do Teatro Amazonas.
Após a última de quatro restaurações, feita pelo Governo do Estado em 1990, ganhou uma orquestra de primeira classe, um coro e balé. A partir daí, retomou seu apogeu com a apresentação em seu palco de espetáculos clássicos e populares de teatro e dança, e shows de grandes estrelas nacionais e internacionais: Simone, Caetano Veloso, Mercedes Sosa, Roberto Carlos, Adriana Calcanhoto, Nana Caymmi, Milton Nascimento, Zezé Mota, José Carreras, Maria Lúcia Godoy, Edson Cordeiro, Arthur Moreira Lima, Zubin Mehta, Orquestra Sinfônica Brasileira, Amazonas Filarmônica ,coral do Amazonas, Corpo de Dança do Amazonas, Antonio Gades, Paulo Autran, Fernanda Montenegro, Marília Pêra...
Na falta da sonhada apresentação do grande Caruso, ganhou de presente a voz do grande Pavarotti, em uma visita-surpresa, quando ali cantou para 50 privilegiados ouvintes. Sem o sonhado balé de Ana Pavlova, viu o filho de Manaus, Marcelo Gomes Mourão, principal bailarino do American Ballet Theater, “dançando no coração da Amazônia II”.
O ta lento dos intérpretes e o requinte da platéia eram uma evocação das noites de brilho que enfeitavam as estréias de temporadas no auge do Teatro. Além disso, o templo da ópera na Amazônia estava novamente de portas abertas, como nos áureos tempos, abrigando desde 1997 o Festival Amazonas de Ópera, o Festival Amazonas de Jazz, o Amazonas Film Festival e o Festival Amazonas de Dança.
Depois de ter sido palco de espetáculos inesquecíveis, O Teatro Amazonas apresenta, também, o espetáculo que é Manaus, e suas próximas atrações: a Ponta Negra, o Grande Aquário (Amazonarium) e a Copa do Mundo de 2014.
E a Unidos de Vila Maria, com sua orquestra, seu corpo de baile e seu coral de quatro mil vozes, com imensa alegria canta as glórias desse templo da ópera de Manaus, em forma de ópera popular, o carnaval.